Meus livros

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segunda-feira, dezembro 31, 2007

A Máquina do Mundo

Carlos Drummond de Andrade
E como eu palmilhasse vagamente uma estrada de Minas, pedregosa, e no fecho da tarde um sino rouco
se misturasse ao som de meus sapatos que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas
lentamente se fossem diluindo na escuridão maior, vinda dos montes e de meu próprio ser desenganado,
a máquina do mundo se entreabriu para quem de a romper já se esquivava e só de o ter pensado se carpia.
Abriu-se majestosa e circunspecta, sem emitir um som que fosse impuro nem um clarão maior que o tolerável
pelas pupilas gastas na inspeção contínua e dolorosa do deserto, e pela mente exausta de mentar
toda uma realidade que transcende a própria imagem sua debuxada no rosto do mistério, nos abismos.
Abriu-se em calma pura, e convidando quantos sentidos e intuições restavam a quem de os ter usado os já perdera
e nem desejaria recobrá-los, se em vão e para sempre repetimos os mesmos sem roteiro tristes périplos,
convidando-os a todos, em coorte, a se aplicarem sobre o pasto inédito da natureza mítica das coisas,
assim me disse, embora voz alguma ou sopro ou eco ou simples percussão atestasse que alguém, sobre a montanha,
a outro alguém, noturno e miserável, em colóquio se estava dirigindo: "O que procuraste em ti ou fora de
teu ser restrito e nunca se mostrou, mesmo afetando dar-se ou se rendendo, e a cada instante mais se retraindo,
olha, repara, ausculta: essa riqueza sobrante a toda pérola, essa ciência sublime e formidável, mas hermética,
essa total explicação da vida, esse nexo primeiro e singular, que nem concebes mais, pois tão esquivo
se revelou ante a pesquisa ardente em que te consumiste... vê, contempla, abre teu peito para agasalhá-lo.”
As mais soberbas pontes e edifícios, o que nas oficinas se elabora, o que pensado foi e logo atinge
distância superior ao pensamento, os recursos da terra dominados, e as paixões e os impulsos e os tormentos
e tudo que define o ser terrestre ou se prolonga até nos animais e chega às plantas para se embeber
no sono rancoroso dos minérios, dá volta ao mundo e torna a se engolfar, na estranha ordem geométrica de tudo,
e o absurdo original e seus enigmas, suas verdades altas mais que todos monumentos erguidos à verdade:
e a memória dos deuses, e o solene sentimento de morte, que floresce no caule da existência mais gloriosa,
tudo se apresentou nesse relance e me chamou para seu reino augusto, afinal submetido à vista humana.
Mas, como eu relutasse em responder a tal apelo assim maravilhoso, pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,
a esperança mais mínima — esse anelo de ver desvanecida a treva espessa que entre os raios do sol inda se filtra;
como defuntas crenças convocadas presto e fremente não se produzissem a de novo tingir a neutra face
que vou pelos caminhos demonstrando, e como se outro ser, não mais aquele habitante de mim há tantos anos,
passasse a comandar minha vontade que, já de si volúvel, se cerrava semelhante a essas flores reticentes
em si mesmas abertas e fechadas; como se um dom tardio já não fora apetecível, antes despiciendo,
baixei os olhos, incurioso, lasso, desdenhando colher a coisa oferta que se abria gratuita a meu engenho.
A treva mais estrita já pousara sobre a estrada de Minas, pedregosa, e a máquina do mundo, repelida,
se foi miudamente recompondo, enquanto eu, avaliando o que perdera, seguia vagaroso, de mãos pensas.
Sobre Drummond: http://dafilosofia.blogspot.com

domingo, dezembro 16, 2007

Fresta

Em meus momentos escuros
Em que em mim não há ninguém,
E tudo é névoas e muros
Quanto a vida dá ou tem,
Se, um instante, erguendo a fronte
De onde em mim sou aterrado,
Vejo o longínquo horizonte
Cheio de sol posto ou nado
Revivo, existo, conheço,
E, ainda que seja ilusão
O exterior em que me esqueço,
Nada mais quero nem peço.
Entrego-lhe o coração.
(De: O Cancioneiro, Fernando Pessoa)

sábado, dezembro 01, 2007

Simples assim

Se tu és feliz ou não , não sei!
Que és amada, sim!
Só posso falar por mim,
- Desde o primeiro olhar te amei!

Tão simples! Mineiro diante do mar
Contemplando o sol,
Boquiaberto, pasmo.
Pasmo pelo esplendor do nascer ou do ocaso
Tendo a alma extasiada
Pelo encanto deste primeiro orgasmo.

Pasmo. Pasmo por perceber que a vida vai além,
E logo ali, detrás da serra,
Além do além,
Onde o olhar no azul encerra
O início d’outro além,
há esplendores e esplendores,
de sóis-nascentes e sol-pores,
há mares, há luzes, livres,
a gozo de infinitos amores.

Simples assim:
Do nascente ao pôr-do-sol!
Sem falar da noite,
Do silêncio, da paz, da lua e das estrelas,
Sem falar dos sonhos,
E outras formas de vê-la.
Sem falar do mar... dos horizontes... do teu olhar...

Simples assim!
Sem falar de ti,
Sem falar de mim,
E sem se quer agente...

domingo, novembro 25, 2007

Agora... Noite, silêncio, e cifras

Não sei de onde vem a música
Se da poesia invisível
Se dos olhos que meus olhos não vêem...

Gosto disso.
O latir do meu cão
Perdidos como eu, estão
Poetas e poetisas
E a própria escuridão.

Em quatro minutos soa o silêncio do novo dia...
Talvez eu te veja...
Meus olhos
Minha cegueira.

E no bocejo do dia
O abrir dos olhos
A paisagem sonhada
A luz no horizonte
Nos campos da fantasia...
Noite, silêncio, e cifras...
Música...
Uivos e poesia;

Meu olhar e seu olhar...
Brisa ceifeira.

Anjos abrem asas
Espalham perfumes
Forma-se ondas de luz nos ares do pensar;
E dos olhos cegos arregalados
Donde pasmo amor evapora a cantar
Contos cifrados de notas quiméricas se quedam
N flauta mágica do silêncio
E o deus das trevas é o mesmo deus d sonhar.

domingo, novembro 11, 2007

Amigos

Andávamos, eu e minha melhor amiga, nos corredores do supermercado.
_ Sim, eu também tenho uma melhor amiga!
É preciso ter amigos, e entre eles um grande amigo; O amigo.
É triste não ter amigos.Pior ainda é não ser amigo de ninguém,
É como estar vazio, ser um vazio,
E se ver perdido noutro vazio, dentro de um abismo que, em nada, não nos convém.

E minha melhor amiga tem um grande amigo
Posso afirmar com segurança
Cabe a ela o direito de julgar e decidir.
Mas isso não é conveniente
Não se julga os amigos,
E sim os observamos para melhor conhecê-los
E nos tornarmos melhor amigo
Assim podemos melhor servi-los e ser bem servido.

Andávamos,
Aqui e acolá catando itens
A melhor qualidade
O melhor preço
O mais necessário
E os supérfluos de grande apreço.

Falávamos de valores,
Não de produtos de atacado e varejo,
Falávamos de amizade, de amor,
De formas e maneiras
De doação e aceitação
De reciprocidade de desejos.
Falávamos indiretamente de mim
Por metáforas, rodeios...
Mas como melhor amiga e conselheira
Ela conhece de meu juízo minhas lucidezes
E meus constantes devaneios.

Ao passar pelo caixa ela quis chocolate
Uma caixa do comum, sortida de cores e sabor,
Pensou nos amigos
Eles têm gosto variado
E quis uma caixa especial
Que continha uma dúzia de ovinhos dourados.

_ Parecem ovos de colibri. Eu disse.
_ Por que de colibri? Ela indagou-me.

Então tive de improvisar uma história:
“Os colibris, ao anoitecer, bem à hora d’ângelus;
(hora da Ave Maria)
Voam como uma fecha,
Em linha reta, rumo ao céu vão
Vão e beijam o sol.
O sol que a esta hora
De tanto ser cultuado
Emocionado chora
Chora lágrimas douradas
Chora fios de mel
E uma gota mágica é mel cristalizado.
E entre todos os beija-flores
Só um a cada dia beija o raio encantado;
Este colibri, então, à noite põe,
Em seu alvo ninho de algodão,
Doze ovos dourados
E entre eles nossas preces,
(a mais bem rezada),
Para que o sol venha e os beba a cada manhã
Antes da sua grande jornada.


Tudo se repete todo dia quando o sol desce
E cansado e sonolento lacrimeja antes de adormecer, exceto se estivermos mal-humorados.’’

Ela não rio, pensei, foi uma história boba. Ela não é mais criança.

Ao chegarmos em casa ela embrulhou a caixa de ovos dourados em papel de presente
E entregou-me dizendo:
_ Amanhã de manhã dê-os à sol.

Fiz de desentendido.
_ se não houver sol?
_Então voe! Disse e riu, lindíssima.

Animou-me até convencer-me de que seria bom, me faria bem aquele gesto.
Mas a todo instante eu me lembrava de que dias antes eu havia me decepcionado ao oferecer uma barra de chocolate a essa mesma pessoa que esta recusara dizendo não querer nada que procedesse de mim: Nem chocolates, nem flores, nem versos nem olhares, pensamentos...
Meus dias tem sido amargos
As manhãs lúgubres..

Depois de uma semana aqui estou
Nesta manhã de sol
Sentado à sombra desta tamarindo
Comendo os ovos dourados
Chorando em poemas
Lendo-os
Me identificando e rindo.
Ai, como eu queria que minha melhor amiga estivesse aqui!

sexta-feira, novembro 09, 2007

Bocas Roxas

Bocas roxas de vinho,
Testas brancas sob rosas,
Nus, brancos antebraços
Deixados sobre a mesa;
Tal seja, Lídia, o quadro
Em que fiquemos, mudos,
Eternamente inscritos
Na consciência dos deuses.
Antes isto que a vida
Como os homens a vivem
Cheia da negra poeira
Que erguem das estradas.
Só os deuses socorrem
Com seu exemplo aqueles
Que nada mais pretendem
Que ir no rio das coisas.

quarta-feira, novembro 07, 2007

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades _ Camões

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o Mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferente em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto
E, afora esta mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de amor espanto,
Que não se muda já como soía.
Veja: Camões _ o poeta.

sábado, novembro 03, 2007

Saúde e Bem-estar

Saúde & Bem-Estar e qualidade de vida
Qualidade de vida é a ordem do momento. E isso não é uma onda, não; uma moda passageira, que dará lugar a outro estilo de vida ou a uma nova ordem de cuidados para o bem-estar comum, com qualidade, sem doenças e grandes traumas; isso é resultado de um trabalho de conscientização desenvolvido pelos órgãos públicos, através da medicina, da ciência, das entidades religiosas e etc.

A ordem é permanente e única, e é a mesma de sempre: “Cuide-se bem!” ou, “Previne-se”! a saúde do seu espírito depende da saúde do seu corpo, seu sucesso na vida depende do seu estado geral, a harmonia do corpo e do espírito.

Não importa o tamanho de suas conquistas, e sim, como você vive cada momento de sua existência, a sua história. Como o protagonista dessa história, VOCÊ, está empenhado no seu papel de viver?

Viver é a sua responsabilidade.

Vários órgãos convidam você para se juntar a eles para cumprir se papel com dignidade e sucesso: “Academias, spars, dietas...” mas qual deles é o melhor aliado? Qual oferece mais segurança? O mais seguro seria indubitavelmente o mais confiável... e descobrir isso não é nada fácil. Será que devemos seguir a massa?

Existem muitos veículos do “bem-estar” no mercado. Todos prometem o melhor resultado, contudo, pelas divergências dos caminhos opostos, nem todos oferecem segurança.

Devemos ouvir os profissionais da área?

Em todos esses órgãos existem profissionais bem treinados e até mesmo conhecedores da ciência do bem-viver. Então, somos jogados de um lado para o outro no embalo da arte do marketing.

Mas a natureza, mãe e protetora, que retém em si a solução para todas as pestes e maledicências, convida-nos a uma reflexão sobre a busca do bem-estar, equilíbrio, harmonia, enfim, uma integração, sobre nós estarmos bem com a vida, de bem consigo mesmo, gozando a saúde em sua plenitude.

Não entre na onda da onda, você é diferente da massa embora faça parte dela; você é único, especial, e seu organismo é o único grupo auxiliar que pode lhe oferecer conselhos e exigências. E ele o faz reagindo conforme o seu comportamento para com ele.

Então se cuide! Escolha bem seus alimentos. Faça exercícios físicos não para obter status e parecer o que na verdade não é, mas para obter saúde. Fuja dos anabolizantes. Escolha bem seus alimentos, consuma alimentos naturais e de procedência confiável.

Dê importância ao que é importante, você.

Faça mudança na sua rotina, mudando seu cardápio, praticando exercícios físicos, exercitando a mente...

Comece pelo seu interior.

Uma ótima escolha é entrar em forma, ficar mais leve, isso impulsiona às alturas a auto-estima. Sentir-se bem e cuidar-se com carinho é a melhor maneira de atrair a felicidade e ter mais disposição para correr atrás e alcançar nossos objetivos.

“Todo cuidado que dispensamos ao nosso corpo é uma prova real de agradecimento a Deus pelo grande fato de sermos humanos”. _ Dinamor.
Cuidado com os ANABOLIZANTES.

_Essa é minha reflexão de hoje.

Tenham todos um ótimo feriado. Cuidem-se!

Saúde & Bem-Estar

Lifelike.

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terça-feira, outubro 23, 2007

Dados biográficos _ Carlos Drummond De Andrade

Mas que dizer do poeta
Numa prova escolar?
Que ele é meio pateta
E não sabe rimar ?
Que veio de Itabira,
Terra longe e ferrosa ?
E que seu verso vira,
De vez em quando, prosa ?
Que é magro, calvo, sério
(na aparência ) e calado,
com algo de minério
não de todo britado?
Que encontrou no caminho
Uma pedra e, estacando,
Muito riso escarninho
O foi logo cercando?
Que apesar dos pesares
Conserva o bom-humor
Caça nuvens nos ares,
Crê no bem e no amor ?

Mas que dizer do poeta
Numa prova escolar
Em linguagem discreta
Que lhe saiba agradar?

sábado, outubro 20, 2007

Ainda que mal...

Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entendas,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda que mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda, assim, pergunto:
me amas?
E me queimando em teu seio,
me salvo e me dano...
... de amor.
Carlos Drummond de Andrade

sábado, outubro 13, 2007

O sino da minha aldeia...

O sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro de minha alma.

E é tão lento o teu soar,
Tão como triste da vida,
Que já a primeira pancada
Tem o som de repetida.

Por mais que me tanjas perto
Quando passo, sempre errante,
És para mim como um sonho.
Soas-me na alma distante.

A cada pancada tua,
Vibrante no céu aberto,
Sinto mais longe o passado,
Sinto a saudade mais perto.
Fernando Pessoa

sábado, outubro 06, 2007

Papai Noel às Avessas

Carlos Drummond de Andrade

Papai Noel entrou pela porta dos fundos
(no Brasil as chaminés não são praticáveis),
entrou cauteloso que nem marido depois da farra.
Tateando na escuridão torceu o comutador
e a eletricidade bateu nas coisas resignadas,
coisas que continuavam coisas no mistério do Natal.
Papai Noel explorou a cozinha com olhos espertos,
achou um queijo e comeu.
Depois tirou do bolso um cigarro que não quis acender.
Teve medo talvez de pegar fogo nas barbas postiças
(no Brasil os Papai-Noéis são todos de cara raspada)
e avançou pelo corredor branco de luar.
Aquele quarto é o das crianças
Papai entrou compenetrado.
Os meninos dormiam sonhando outros natais muito mais lindos
mas os sapatos deles estavam cheinhos de brinquedos
soldados mulheres elefantes navios
e um presidente de república de celulóide.
Papai Noel agachou-se e recolheu aquilo tudo
no interminável lenço vermelho de alcobaça.
Fez a trouxa e deu o nó, mas apertou tanto
que lá dentro mulheres elefantes soldados presidente brigavam por causa do aperto.
Os pequenos continuavam dormindo.
Longe um galo comunicou o nascimento de Cristo.
Papai Noel voltou de manso para a cozinha,
apagou a luz, saiu pela porta dos fundos.
Na horta, o luar de Natal abençoava os legumes.

quarta-feira, outubro 03, 2007

Resíduo _ Drummond de Andrade


De tudo ficou um pouco
Do meu medo. Do teu asco.
Dos gritos gagos. Da rosa
ficou um pouco.

Ficou um pouco de luz
captada no chapéu.
Nos olhos do rufião
de ternura ficou um pouco
(muito pouco).

Pouco ficou deste pó
de que teu branco sapato
se cobriu. Ficaram poucas
roupas, poucos véus rotos
pouco, pouco, muito pouco.

Mas de tudo fica um pouco.
Da ponte bombardeada,
de duas folhas de grama,
do maço
― vazio ― de cigarros, ficou um pouco.

Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.

Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.

Se de tudo fica um pouco,
mas por que não ficaria
um pouco de mim? no trem
que leva ao norte, no barco,
nos anúncios de jornal,
um pouco de mim em Londres,
um pouco de mim algures?
na consoante?
no poço?

Um pouco fica oscilando
na embocadura dos rios
e os peixes não o evitam,
um pouco: não está nos livros.
De tudo fica um pouco.
Não muito: de uma torneira
pinga esta gota absurda,
meio sal e meio álcool,
salta esta perna de rã,
este vidro de relógio
partido em mil esperanças,
este pescoço de cisne,
este segredo infantil...
De tudo ficou um pouco:
de mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo na minha manga,
de tudo ficou um pouco;
vento nas orelhas minhas,
simplório arroto, gemido
de víscera inconformada,
e minúsculos artefatos:
campânula, alvéolo, cápsula
de revólver... de aspirina.
De tudo ficou um pouco.

E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.

Mas de tudo, terrível, fica um pouco,
e sob as ondas ritmadas
e sob as nuvens e os ventos
e sob as pontes e sob os túneis
e sob as labaredas e sob o sarcasmo
e sob a gosma e sob o vômito
e sob o soluço, o cárcere, o esquecido
e sob os espetáculos e sob a morte escarlate
e sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes
e sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e sob os gonzos da família e da classe,
fica sempre um pouco de tudo.
Às vezes um botão. Às vezes um rato.
(Carlos Drummond De Andrade)

sexta-feira, setembro 28, 2007

O Chão é Cama



O chão é cama para o amor urgente,
amor que não espera ir para a cama.
Sobre o tapete ou duro piso, a gente
compõe de corpo e corpo a úmida trama.
E para repousar do amor, vamos à cama

domingo, setembro 23, 2007

Os Ombros Suportam o Mundo

Carlos Drummond de Andrade

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teu ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação.

Do livro "sentimento do mundo",
estes versos também encontram-se no livro:
"Carlos Drummond de Andrade, Antologia Poética".

sexta-feira, setembro 21, 2007

Acordar, viver _ Carlos Drummond de Andrade

Como acordar sem sofrimento?
Recomeçar sem horror?
O sono transportou-me
àquele reino onde não existe vida
e eu quedo inerte sem paixão.

Como repetir, dia seguinte após dia
seguinte,
a fábula inconclusa,
suportar a semelhança das coisas
ásperas
de amanhã com as coisas
de hoje?

Como proteger-me das feridas
que rasga em mim o acontecimento,
qualquer acontecimento
que lembra a Terra e sua púrpura
demente?
E mais aquela ferida que me inflijo
a cada hora, algoz
do inocente que não sou?

Ninguém responde, a vida é pétrea.

quarta-feira, setembro 19, 2007

Autopsicografia _ Fernando Pessoa

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

sábado, setembro 08, 2007

Um Poema _ Ricardo Reis

Coroai-me

Coroai-me de rosas,
Coroai-me em verdade,
De rosas — Rosas que se apagam
Em fronte a apagar-se Tão cedo!
Coroai-me de rosas
E de folhas breves.
E basta.

sexta-feira, agosto 31, 2007

Chove

Desde ontem chove.
Ininterruptamente chove.
Meu Deus, como chove!

Uma enxurrada devastadora desce,
Levando sonhos...
Arrasta grinaldas e trepadeiras
Leva tudo: marias e margaridas;
Nuvens hospedeiras...
Revolve o obscuro
Extrai a seiva às entranhas
E deixa expostas raízes.
E chove.
Torrencialmente chove.
Desde ontem chove!
Ontem, não sei quando...

Águas imundas inundam planícies;
Do alto se vê lama,
Como manto sujo estendido,
Uma mancha de dor e saudade, no gosto,
Meio que doce, no nada vivido.
E chove!
Chove múica.
A música que chove, chove num grito,
Um gemido.
Chove como nunca!

Mal posso ver os meus pés!...

Chove às enxurradas!
Tudo pára nas encostas,
Se espalha pela margem...
Depois de tudo, acaba.
Acaba; tudo acaba.
Bem ou mal, tudo finda, tudo termina;
Acaba!...
E torna-se fértil a várzea.

terça-feira, agosto 28, 2007

BOLETIM _ Sobre o resultado do Enem

"Enem divulga resultado em novembro

O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) irá divulgar na segunda quinzena de novembro o boletim com os resultados do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).
O resultado será enviado aos candidatos pelos Correios e também estará disponível na internet, no site www.inep.gov.br. Realizado no último domingo, o exame contou com a inscrição de 3,5 milhões de estudantes, 200 mil pessoas a menos que em 2006, segundo o Ministério da Educação."

Só em novembro!?
É o que se lê por aí; isso é um absurdo, não acha?

segunda-feira, agosto 27, 2007

Luiz Vaz de Camões

_ Carlos Nejar _

Não sou um tempo
ou uma cidade extinta.
Civilizei a língua
e foi resposta em cada verso.
E à fome, condenaram-me
os perversos e alguns
dos poderosos. Amei
a pátria injustamente
cega, como eu, num
dos olhos. E não pôde
ver-me enquanto vivo.
Regressarei a ela
com os ossos de meu sonho
precavido? E o idioma
não passa de um poema
salvo da espuma
e igual a mim, bebido
pelo sol de um país
que me desterra. E agora
me ergue no Convento
dos Jerônimos o túmulo,
que não morri.
Não morrerei, não
quero mais morrer.
Nem sou cativo ou mendigo
de uma pátria. Mas da língua
que me conhece e espera.
E a razão que não me dais,
eu crio. Jamais pensei
ser pai de santos filhos

quinta-feira, agosto 23, 2007

A DANÇA E A ALMA


A DANÇA? Não é movimento,
súbito gesto musical.
É concentração, num momento,
da humana graça natural.
No solo não, no éter pairamos,
nele amaríamos ficar.
A dança – não vento nos ramos:
seiva, força, perene estar.
Um estar entre céu e chão,
novo domínio conquistado,
onde busque nossa paixão
libertar-se por todo lado...
Onde a alma possa descrever
suas mais divinas parábolas
sem fugir à forma do ser,
por sobre o mistério das fábulas.


(Carlos Drummond de Andrade. Obra completa. Rio de Janeiro: Aguilar, 1964. p. 366.)

domingo, agosto 19, 2007

AVES DE ARRIBAÇÃO

Pensava em ti nas horas de tristeza,
Quando estes versos pálidos compus,
Cercavam-me planícies sem beleza,
Pesava-me na fronte um céu sem luz.

Ergue este ramo solto no caminho.
Sei que em teu seio asilo encontrará.
Só tu conheces o secreto espinho
Que dentro d'alma me pungindo está.
Fagundes Varela

Aves, é primavera! à rosa! à rosa!
Tomás Ribeiro


Obas: Do livro Espumas Flutuantes _ Castro Alves.

quinta-feira, agosto 16, 2007

O mundo sem Platero

Que saudades de Platero!

Que saudade, Platero! Que saudade!...
Saudades das nossas andanças
Nossos segredos
Nossas críticas
Nossa visão do mundo;
Dos seres e coisas
Do estado do Estado do estado...
Visto, dito, e adotado,
Surgindo num azul profundo
E se lançando aos horizontes sonhados
Com todas as tênues cores do mundo.
Mas o mundo, apesar do verde, do verde, do verde... nunca amadurece.
Nossas crianças ainda morrem desnutridas
E nossos velhos heróis ainda padecem.

Saudade das crianças!
Nossas guerras de frutos e flores
Nossas desavenças e nossos amores.
E a umbrosa árvore do nosso descanso
Onde deitávamos a mirar nuvens
Ou balouçávamos nos galhos num suave remanso.
Lembro-me das amoras, tão doces!
E nossas bocas sorridentes e roxas.

Lá dorme Platero!...E eu com ele!
E eu com ele!...
Num sono profundo; sonhando...
Sonhando e sorrindo.
Sonhando que bebe estrelas
Pasmo por a si mesmo se ver no fundo do poço de água cristalina.

Lá, ele ainda vagueia a pascer,
E o campo é amplo, verde e denso,
E as suculentas gramíneas verdejam
E nunca deixam de crescer;
Crescem, crescem, nas serras e veigas...
À margem corre o rio imenso.

Platero ainda cheira a flores: De parreira...
De capim, de cerejeira, de morango, de crianças;...
Sempre flores! Rosas, amoras e oliveiras.
_ Seu cheiro é eterno!
E seu dorso ainda vermelho
Com aroma de morango
Num misto agridoce de cereja
Carreando o bem-te-vi,
Hora o sabiá, o cuco e o gavião.
Enquanto eu, preguiçoso, vôo mais alto
Além da nuvem em formação.

Nossas histórias...
Só nós sabemos que foram vividas.

E a tísica? a do leite de cachorra;
E a volta pra casa!
... Só tu não voltas Platero!
Mas tu estás comigo. Cada vez mais comigo!
Nunca o senti distante; e sim,
Cada vez mais próximo.
Nunca o senti como um burro, Platero, bem sabes,
Sempre o tive como melhor amigo.
E após tal perda e esta solidão
És ainda mais que amigo
És minha metade de vida, meu legítimo irmão!

E as beatas com vestes de missa temendo o lamaçal?
A carruagem enguiçada? _ aquela da humilde família em mudança!
Lembra-te da laranja? A sua!
... E o sorriso meigo daquela criança?!
Fizeste o gesto mais nobre, Platero, que já vi em toda minha vida.
Mas eu me lembro de todos os seu gesto, todos;
E suas dores, por mim ainda são sentidas.
Ah! Aquela sanguessuga! Tive muita pena de ti. Quanta aflição!
E aquele espinho que perfurou sua pata ainda parece furar meu coração.

Ainda queimam Judas.
Ainda enfeitam ruas na véspera da paixão.
Ainda fazem folias e catam à espera de ressurreição.

Ainda queimam Judas...
E tantos Judas ressuscitam.
Só os cristos sempre morrem
E levam consigo a esperança de salvação.

Do alto da minha colina eu vejo tudo.
Eu vejo com os meus e os teus olhos.
Os olhos humanos cada vez mais se cegam
Porque os olhos cegos nunca e enganam.

Contudo, Platero, vale a pena viver.
Ainda se vê primaveras
E após as quaresmeiras florescem os ipês.
E as poucas florestas que restam são vistas
São defendidas por anônimos e artistas.
E fotografadas por turistas
Certamente jamais irão morrer.

Mesmo assim vale viver, vale muito a pena viver!
Pois ainda há quem faça poesia
Há quem fala às flores
Há quem aprende com as águas e suspiram
E solidários despoluem seus odores.

Ah, Platero!... Nossos atalhos, nossos desvios, não nos leva a lugar nenhum.
Tudo que temos é o que somos
E o que o mundo nos tem de igual em comum.
Somos eternos peregrinos
Andando não se sabe pra onde,
Só sabemos que vamos
Colhendo daqui e dali
E no fim nada levamos.

As fugas das estradas
Nossos improvisados trilhos
Nossa ânsia por voar
De menino para homem
De pai para filho
E de velho outra vez menino...
Nós somos apenas poeira
E qual estrelas, para quem teve o céu,
O céu guarda seu brilho.

O canário a cantar na copa das oliveiras
Guarda no canto o canto que procuro
E juro, amigo, não há no mundo maior e mais belo estribilho
Do que o canto da noite a dispersar-se o escuro.

Meus cabelos já não são mais grisalhos...
Minha fronte teima em declínio...
Declinam para a irrealidade.
Meus olhos vêem cores guardadas
Cores vivazes impressas na cortina da saudade.

O seu pelo dourado ao sol, que lindo brilho!
Nunca mais vi graça em andanças
Hoje sou apenas um andarilho.
Vejo o mundo por uma estranha janela
E tudo se passa num segundo;
Meu mundo é um espaço virtual
E eu universo, um quintal sem entrada e sem fundos.

Acho mesmo que me deitei contigo, aí.
Aí, nesse poço de estrelas...
Nesse vácuo
Nesse breu abaixo
Abaixo desteoutro submundo.


Obs: Este foi um texto produzido sem nenhuma intenção de avaliação ou descrição real da obra literária; trata-se simplesmente de uma brincadeira de um amador que, a propósito é grande admirador da fantástica obra poética de (Juan Ramón Jiménez): "Platero & Eu".

quarta-feira, agosto 15, 2007

O verso de hoje _ Para a minha estrela do sul...

Por uma dor de ontem.
_ Versos à Márcia.

Ah! Essas rimas surdas
Às vezes sonoras
Às vezes sujas...
Outras tantas absurdas;
Quais teimam conjugar-se no infinitivo tempo
Casar mê com lhê
Em frase solta e impotente
Cujo clã é passado
E jamais será presente.

Prole conjugada ao vento
Na voz secular da plêiade boêmia,
Sobreviventes de tempos e tempos,
Canta dores eternas e eternos gozos
Dos gozos nossos, gozos mudos,
Gozos de noites e ventos
Qual nunca se teve e nunca teremos.

O gênero sempre muda
Menos a forma e a perfeição;
Contudo cantam nobres versos
Apenas dor, pobreza e solidão;
Vagueiam espectros
A ritmo de passos nômades
À pena de condor, ave forasteira,
Dispersos dos Andes.

Donde viemos não importa
Se de uma janela
Se de uma porta
O que importa é o tempo
A partida e a chegada
Ou vice-versa;
Não importa a estadia
A vida sempre corre depressa.
O que importa ao verso é a música
E a alma cuja voz o expressa.

terça-feira, agosto 14, 2007

Dom

Ó viajem! Ó veleiro galáctico, meu coração!
A viajar nos pampas do espaço,
Noite após noite,
A procura de uma estrela para minha escuridão.

Nessas horas solitárias,
Em que vagueia a lua pela madrugada
Beijando flores recém-nascidas, semimuas, e nuas...
Nas densas florestas e minúsculos jardins,
De vias públicas e secretas veredas,
Tristes são as ruas...
Com o queixo apoiado na mão,
Cotovelo a perfurar dolorido fêmur,
Ou mãos segurando o cérebro sob o peso do que penso...
Absorvo cauteloso o pensamento
Concentro-me na essência desse silêncio
No qual guardo os sentimentos mais profundos e
Capturo da lua e das estrelas a luz
Qual fulgência fizera-me sonhar feliz
Enquanto meus olhos visualizavam estranho mundo...
Onde a encontrei.
Temos senhas e nomes: Eu?
_Raykiss, Lheguelhé, Ray poetray.
Ela?... Não sei.

Insânia; Ou sanidade pagã, certos atos
Que não são reais nem fantasias
Porém chega ser a única alegria dum’alma aflita.

Insanidade pura,
De poder de sedução,
O brilho do olhar e os céus dos olhos
Na meiga face da ilusão.
Ilusão de quem lê,
Ilusão também daquele que digita.

Insanidade sã essa beleza pagã
Que vejo nos céus virtuais
A flutuar nas páginas adornadas de uma moderna escuridão
Que em códigos digitais se formam como estrela da manhã.

Olhares e faces
Afetos e desafetos
Mentes e mentes
Insanas e sãs
Mas que guardam detrás da negra cortina, em si, um coração.

Verdes pâmpanos a adornar seu corpo
Em vez de braços em abraços e lençóis brancos
Enrolas no vazio complexo da Internet
O trauma, a desilusão, a esperança...
E se aquece e se esquece ao próprio calafrio.
E sem apego a carências de si mesma se entrega
Enquanto a noite passa lentamente
E a lua se perde no infinito escuro de azul;
Mas aqueces outras almas carentes
Nos quatro cantos do mundo
Muito além das Américas
Muito além dos pampas do Sul,
Muito além do sono e do silêncio profundo.

Amor estranho, o amor tão distante:
... Amor virtual, futurista, amor turista.
Amor de carnaval.
Amor de Otelo,
Amor e Mítia
_ Título de Dom.
Título que passa
Amor de ressaca
Amor praiano
Amor de Capitu
_ Rainha sem rei.
Amor de Dama
Amor... Amor de dom,
De Dom Poetray.

A página de hoje

13 de agosto

“Sim, são muitos os que perderam o espírito por causa de mulheres e que, por elas, se tornaram escravos. Numerosos, também, os que, por causa delas, pereceram, erraram ou pecaram... Homens, como quereis que s mulheres não sejam fortes, vendo-vos agir assim?”_ ESDRAS.


A página de hoje
Para minha queria Ros@ne

Tive um dia cheio.
Logo no amanhecer tudo já parecia estranho.
_A manhã sugira com ares de rebeldia na sua face de meninice
E sua infantilidade podia ser percebida nos seus atos de inocentes peraltices.
Inocência?... Talvez malandragem; esperteza de sua adolescência.

Toda a jovialidade do dia deixou-se envolver, e eu, com ele.
Eu, que da aurora da minha vida só tenho lembranças do perfume inebriante, das flores, do brilho das cores e do riso da facécia da criança singular despertando para o dia em cada amanhecer! Isso sempre foi alento para as minhas reminiscências.

Tive um dia cheio! E ele ainda não chegou ao fim.

Bem, antes mesmo de abrir os olhos pressenti que tudo seria diferente;
E foi.
Senti cheiro de café enquanto ouvia pássaros cantando,
E da fresta da janela vi um raio de sol...
Não sei porque, pensei em frutas ao invés de flores e mulheres.
Não ouvi SEBASTIAN BACH por opção, o rádio por si o acionou “prelude”
_ minha favorita.
E em seguida veio CHOPIN, numa seqüência de sinfonias extraordinárias interpretada pela orquestra sinfônica da cidade de SP.
Eu pensei em VICTOR YORAN e, não sei porque, em CIVUCA.
Depois não prestei atenção em mais nada, nem nos Roks que se seguiram,dos quais eu tanto gosto.

Para contrariar a lei de MURPH peguei a banda do pão no ar, antes de tocar o chão;
Só perdi os farelos crocantes, mas sempre se perde alguma cosa para se ganhar outros montantes.

Ao ligar o PC tinha mensagens e beijos.
_ Adoro meus amigos do orkut _
Um “ BOM DIAAAAAAAAAAAAA... da minha querida Ros@ne; linda!!!!
E anexo a mais linda mensagem que já li.
E tudo que ela me desejava estava a acontecer:
O dia lindo, de um amanhecer de graça e de luz,
E a esperança à frente, levando minha bandeira e minha cruz.

Meu espírito já sorria então; vi que a vida estava sorrindo.
E como ela, Ros@ne, desejara, eu estava cheio de ânimo.
Só faltava mesmo todo aquele ânimo perdurar até amanhã,
e depois de amanhã, e depois e depois...

Lá aonde fui todas as ruas tem nome de flores
E em algumas até pude ver flores.
Ganhei olhares e sorrisos...
E meu zíper não estava aberto!
Houve até quem parasse ao me ver sentado debaixo de uma árvore lendo Drumom.
Alguém se preocupou ao me ver fazendo anotações num pedaço de papel apoiado no tronco de um coqueiro e me ofereceu ajuda.
E após constatar que eram versos o que eu escrevia
Deu-me então um belo poema pela minha imprudência vadia.

Aquela mulher disse que eu era simpático...
E de cabelos cortados e barba feita eu me senti realmente bonito.
A não ser o orelhão ter engolido meu cartão, tudo andava bem.
Minhas expectativas foram superadas.
Não tive todo o sucesso necessário, ou motivo pra tanta alegria;
Mas foi o meu melhor começo,
O melhor começo de um novo dia.

Tive um dia cheio!...
Meus dias são sempre cheios...
Vou levar muito dele para o amanhã
Porque não quero que ele se acabe.
Quero-o como a um eterno amanhecer!
Quero-o com flores e estrelas...
Quero-o com o brilho das amizades
Com efeitos especiais
Com espaços infinitos e encontros inesperados.
Com os mensageiros de otimismo
Com minha deusa de brilho interstelar...
E até os fantasmas intergalácticos os quero.
Quero tudo de hoje no amanhecer do dia que ainda espero.

Quero Ro@ne...
Quero Márcia...
Quero Sol...
Quero Sereno...
Quero Brisa...
A flor do dia...
A doce poesia...
E a realidade em fusão com esta fantasia.

Minha querida Sane
Neste dia, boa tarde!
E cedo ou tarde
Desejo-lhe sempre bom diaaaaaaaaaa!....

domingo, agosto 12, 2007

Alento ao desalento

_ Um riso para o meu pranto!

Tenho os passos firmes
Agora que estou agarrado a tuas mãos invisíveis.
Confio nos teus atos seguros
Confio na tua atenção para comigo
No teu cuidado de Pai
No teu capricho de mãe
No teu zelo de amigo.

Hoje tenho os s passos firmes
Porque sei que não estou só
E que jamais estarei;
Pois sei que até o próprio chão
Criaste para amparar-me
E as pedras dão sentido ao meu caminho.

E por todo universo existem estrelas.

Mãos que outrora me acariciavam
Hoje, aplaudem meu descontrole e meu vacilo.
A voz que dizia prelúdios de amor
Hoje, resmunga augúrios a minha desilusão.

Mas sou forte.
Tenho os passos firmes.
Ao chão decairei somente após a morte.
Mas meu espírito, bem sei, até em tal circunstância, ascenderei glorioso
Levado pela brisa de tua misericórdia protetora.

Não decairei jamais
Nas profundezas do abismo,
Como antes andei, abatido e desprezível,
Sob o domínio da turbulência dos insensíveis.

Liberto, agora, está minh’alma das presas do vício,
Das armadilhas do sexo,
Das façanhas dos desejos complexos,
Sem precedentes fixos num sentimento completo
Que seja de benção divina e que abençoa,
Que seja amor verdadeiro, humano,
Próprio de quem ama, compartilha, e perdoa.

Sinto frio.
Meu corpo arde de carência e desejo.
Tudo em meu pensar me leva a promíscuos anseios
De viver uma emoção de prazer e satisfação;
Contudo, o que me vem de bom grado é pecado
E o que me vem da benção de matrimônio
Vem-me como por obrigação ou engano.

Muito já lamentei meu destino,
O presente de um futuro em projeção

Na minha velha face de menino;
Não obstante, hoje, não rio,
Também não choro,
Sou indiferente à carne,
Sou mais teu espírito consolador,
_ Barco, âncora, vela, e o leme em vossa mão.
Sou o barco à deriva navegando
Sobre s ondas turbulentas
E mesmo quando no vácuo horripilante da maré
Ceio, em paz, da fartura do teu alento.

E vendo o reluzir do céu fulgente em pranto
Doando ao mar sereno e vento
Durmo na paz do teu acalanto.

É; São assim meus dias nos últimos tempos...
Não falo de mim
Não murmuro aos ventos
Não quero dividir dor;
Não darei a outro o sabor do meu sofrimento.


Não falo de mim
Porque a outro pareceria tormento
Ninguém entenderia que minha dor não é simplesmente dor,
E sim, riqueza que faz crescer um espírito em desenvolvimento.

Vou assumir os pecados perante o mundo
Os meus
Os dela
Os deles...
E de quem mais quiser que eu assuma.
Assumirei pecados e penitências,
E ainda porei meus arrependimentos em suma.


Hoje; logo hoje!
Dia em que a data pesa mais que a cruz
E o domingo é mais sangrento que o dia da paixão;
Não que eu queira me comparar a Cristo
Mas meus dias são antevésperas e vésperas
E nunca manhãs de ressurreição...

Minha cruz não pesa mais que pétala ao vento
Ou o madeiro sobre o cérebro das formigas
Porém, para um homem nada mais é tortura
Que a tortura de noites e noites mal dormidas.

Novamente estou casto
Como jovem sacristão
Que abre mão da namorada
Para glória da devoção.

Ingenuidade de criança
Que não sabe o maior mandamento:
Amar a Deus sobre todas as coisas,
E de toda tua alma,
E a ti mesmo que é o próximo mais próximo
E de Deus Divino templo.

Mas a Deus pertence o tempo
Como o homem pertence aos ventos da emoção.
Vou de barco, vou de pé, vou de vento, de sonhos
De poeira de constelações
Vou de cruz aos ombros e cravos
Ditando meu pergaminho,
Mas vou, quedando-me e caindo,
Mas de pés firmes no caminho
Porque tenho o afago Divino
E uma mão na minha mão.

sábado, agosto 11, 2007

Equinócio

Gira, gira, gira terra
Dá-me noite
Dá-me dia
Equinócio de outono e primavera
Dá-me luz e alegria.

Gira, gira, gira terra, gira!...
Translada o todo por inteiro
Que não percas Coaracy
Faz-se tempo tempo inteiro.

Eu também vou girando, girando...
Às bordas dessa ciranda má.
Sou um grão nessa cadência
E quem joeira?..
_ Sabe-se lá!

Cada vida é um verso
Num poema, uníssono, sem fim
E cada átomo do universo
Num átimo chega ao fim.

A cada ismo _ dogma _ que se cria
Um deus se diviniza
A cada nova teopsia
A Deus verdadeiro se dizima.

Por isso gira; gira terra, gira!
Enamora-se do sol
Não se deixe anoitecer
Não perca a ópera
Não perca a órbita,nem o perca,
Não se perde um bem querer.

Eis que vivo, agora, girando, girando...De sol a sol,
Por mais querer,
Aquecer-me d’outro sol
Por querer mais-que-querer.

sexta-feira, agosto 10, 2007

Bocas Roxas - Ricardo Reis (heterônimo de Fernando Pessoa)

Bocas roxas de vinho,
Testas brancas sob rosas,
Nus, brancos antebraços
Deixados sobre a mesa;
Tal seja, Lídia, o quadro
Em que fiquemos, mudos,
Eternamente inscritos
Na consciência dos deuses.
Antes isto que a vida
Como os homens a vivem
Cheia da negra poeira
Que erguem das estradas.
Só os deuses socorrem
Com seu exemplo aqueles
Que nada mais pretendem
Que ir no rio das coisas.

quinta-feira, agosto 09, 2007

Todas as cousas que há neste mundo

"Todas as cousas que há neste mundo
Têm uma história,
Excepto estas rãs que coaxam no fundo
Da minha memória.


Qualquer lugar neste mundo tem
Um onde estar,
Salvo este charco de onde me vem
Esse coaxar.
Ergue-se em mim uma lua falsa
Sobre juncais,
E o charco emerge, que o luar realça
Menos e mais.
Onde, em que vida, de que maneira
Fui o que lembro
Por este coaxar das rãs na esteira
Do que deslembro?
Nada. Um silêncio entre jucos dorme.
Coaxam ao fim
De uma alma antiga que tenho enorme
As rãs sem mim."_Fernado Pessoa

sábado, agosto 04, 2007

Que suave é o ar! Como parece _ Fernando Pessoa

Que suave é o ar! Como parece
Que tudo é bom na vida que há!
Assim meu coração pudesse
Sentir essa certeza já.
Mas não; ou seja a selva escura
Ou seja um Dante mais diverso,
A alma é literatura
E tudo acaba em nada e verso.

quarta-feira, agosto 01, 2007

Flor menina

Coroai-me,
Flor menina,
Coroai-me;
Nesta noite coroai-me.

Coroai-me com teu olhar
Mesmo que seja um olhar furtivo;
Mesmo que seja apenas um flerte
Desses que nos deixa inibidos e cheio de dúvidas;
Desses, que nos faz suspirar sem razão;
Simplesmente por ser esta razão superior e mais pura, inalcançável ao nosso entendimento.
Um flerte!... Desses que por si sacodem o silêncio com voz de trovão
E somente a alma o ouve como fosse melodia.

Coroai-me, flor menina, nessa noite,
Coroai-me com teu sorriso
Com esse sorriso que só teu olhar possui.
Corroai-me de pétalas
Essas pétalas que como raio escapam dos seus olhos e clareia minha existência.

Ah! Essa esperança...
Essa esperança oblíqua
Nessa espera iníqua
Nesse desejo profundo,
Sobrevivente das malícias do mundo,
De sentimentos profanos e imundos, que condenam a beleza da inocência de um sentimento tão puro.

Coroai-me, nessa noite, flor menina,
Com tua presença e teu riso discreto e tímido...
Não se perturbe por mim, não por mim,
Apenas fique, aqui, quieta como sempre
Mas com certeza a minha noite se iluminará.
E deixe que meus olhos guardem n’alma toda tua sublime essência
Como lembranças e espanto de um eclipse.

sexta-feira, julho 27, 2007

A minha vida é um barco abandonado

A minha vida é um barco abandonado
Infiel, no ermo porto, ao seu destino.
Por que não ergue ferro e segue o atino
De navegar, casado com o seu fado ?
Ah! falta quem o lance ao mar, e alado
Torne seu vulto em velas; peregrino
Frescor de afastamento, no divino
Amplexo da manhã, puro e salgado.
Morto corpo da ação sem vontade
Que o viva, vulto estéril de viver,
Boiando à tona inútil da saudade.
Os limos esverdeiam tua quilha,
O vento embala-te sem te mover,
E é para além do mar a ansiada Ilha.

segunda-feira, julho 16, 2007

Tragédia! Acidente grave abala Itapevi.




Obra desaba e deixa habitantes apreensivos: será que houve mortos?

Nessa manhã, antes do horário de almoço, a obra que estava preste a ser inaugurada, e seria uma loja, veio abaixo.
No local várias viaturas e carros de resgate. O policiamento cuidava do cordão de isolamento para impedir o acesso dos curiosos e transeuntes que se recusavam voltar para prosseguir seus destino. No momento caia uma garoa, aliás, desde à noite chovia.
O curioso é que todos comentam este fato como se a chuva fosse a causa do acidente.
Mas desde quando a estrutura de aço da mesma foi erguida e os blocos foram preenchendo os enormes vãos formando uma extensa parede, todos que passavam na rua diziam: “Este prédio vai cair!” Muitos atravessam a rua ao se aproximar da obra, evitando assim o azar de estar por perto quando o previsto acontecesse. E aconteceu!
“Por onde anda a fiscalização?” Diziam.

Fala-se em vítimas que sofreram ferimentos leves; será? Os funcionários que permanecem no local nada dizem sobre seus companheiros, e os bombeiros também nada informam. Porém ouve-se o boato de que houve três mortos. Mas autoridades garantem: São só boataos.
Estranho é que no local há uma enorme cobertua, bem arrumada, sobre os escombros. Uns dizem que é para preservar o local até a chegada do pessoal da perícia...
Mas duas horas depois as máquinas ainda não estavam trabalhando na retirada dos entulhos, e no momento do desabamento, segundo os funcionários de lojas vizinhas, havia trabalhadores no alto, do prédio.

Não há como um acidente de tal proporção não causar danos gravíssimo. Além do mais nosso município já sofre discriminação de todos os âmbitos político-social.
Ouvi pessoas, engravatados, dizendo coisas desagradáveis como: “Aqui em Itapevi não é lugar de se viver!” E os outros concordando acrescentaram que só louco investiria num lugar como este. _ Fiquei indignado.

sexta-feira, julho 13, 2007

Agora...

Noite, silêncio, e cifras.
Não sei de onde vem a música
Se da poesia invisível
Se dos olhos que meus olhos não vêem...

Gosto disso.
O latir do meu cão
Perdidos como eu, estão
Poetas e poetisas
E a própria escuridão.

Em quatro minutos soa o silêncio do novo dia...
Talvez eu te veja...
Meus olhos
Minha cegueira.

E no bocejo do dia
O abrir dos olhos
A paisagem sonhada
A luz no horizonte
Nos campos da fantasia...
Noite, silêncio, e cifras...
Música...
Uivos e poesia;

Meu olhar e seu olhar...
Brisa ceifeira.

Anjos abrem asas
Espalham perfumes
Forma-se ondas de luz nos ares do pensar;
E dos olhos cegos arregalados
Donde pasmo amor evapora a cantar
Contos cifrados de notas quiméricas se quedam
N flauta mágica do silêncio
E o deus das trevas é o mesmo deus d sonhar.

segunda-feira, julho 09, 2007

Falta de atitude

Impotência?

Também me ressuscitam as emoções,
Os desejos,
Os mesmos da juventude:
Carência, carícias
Em ardentes devaneios
Da libido tímida,
Adormecida precocemente,
Inexperiente.

Tu, senhora, vivida,
experiente
Desde a adolescência sabida,
Certamente sorri;
Ri
Da minha imaturidade
Apesar dos meus 40...

Ai! Essa dor...
Essa ardência espacmástica!...

Teu olhar minucioso...
O senso judicioso;
Febre terçã!

Recesso versos excesso.

Essa abstinência é demência.

A loucura mascarada de fidelidade em retrato de família.
Uma castidade que induz ao pecado e que condena ao fogo deste inferno que é estar vivo,
Assim!
Este não sou eu!
Eu sou quem neste instante desmaia no meio das tuas coxas
Gemendo, gemendo gemendo amor! Amor!! Amor amor amor! Áaaaaaaaa! Môrrrrrrrrrr!Áormor...Amôôramor!!!!!!!!!!!!!!!Te ãm

Já que me ressuscitando para esta vida de desejos
Vês em mim homem e qualidade
Ensina-me novamente a viver
Como jovem garoto de meia idade;

Estou tão...
Nem sei como dizer
Que tu és a mulher por quem em toda minha vida
Tive maior desejo.

Perdoe-me por minha falta de iniciativa; por favor!

sábado, julho 07, 2007

Um belo poema

É um campo verde e vasto
(Fernando Pessoa)

É um campo verde e vasto,
Sozinho sem saber,
De vagos gados pasto,
Sem águas a correr.
Só campo, só sossego,
Só solidão calada.
Olho-o, e nada nego
E não afirmo nada.
Aqui em mim me exalço
No meu fiel torpor.
O bem é pouco e falso,
O mal é erro e dor.
Agir é não ter casa,
Pensar é nada Ter.
Aqui nem luzes (?) ou asa
Nem razão para a haver.
E um vago sono desce
Só por não ter razão,
E o mundo alheio esquece
À vista e ao coração.
Torpor que alastra e excede
O campo e o gado e os ver.
A alma nada pede
E o corpo nada quer.
Feliz sabor de nada,
Inconsciência do mundo,
Aqui sem porto ou estrada,
Nem horizonte no fundo.

quinta-feira, junho 28, 2007

Fernando Pessoa

Ricardo Reis (heterônimo de Fernando Pessoa)
A Palidez do Dia

A palidez do dia é levemente dourada.
O sol de inverno faz luzir como orvalho as curvas
Dos troncos de ramos Secos.
O frio leve treme.
Desterrado da pátria antiqüíssima da minha
Crença, consolado só por pensar nos deuses,
Aqueço-me trêmulo A outro sol do que este.
O sol que havia sobre o Parténon e a Acrópole
O que alumiava os passos lentos e graves
De Aristóteles falando.
Mas Epicuro melhor

Me fala, com a sua cariciosa voz terrestre
Tendo para os deuses uma atitude também de deus,
Sereno e vendo a vida À distância a que está.

domingo, junho 24, 2007

Fernando Pessoa

A pálida luz da manhã de inverno

A pálida luz da manhã de inverno,
O cais e a razão
Não dão mais 'sperança, nem menos 'sperança sequer,
Ao meu coração.
O que tem que ser
Será, quer eu queira que seja ou que não.

No rumor do cais, no bulício do rio
Na rua a acordar
Não há mais sossego, nem menos sossego sequer,
Para o meu 'sperar.
O que tem que não ser
Algures será, se o pensei; tudo mais é sonhar.

No meu caminho



Havia uma árvore no meio do caminho.
No meio do caminho havia uma árvore e um caminho.
No meio da árvore havia um caminho...
No meio do caminho, um abrigo.

A árvore continua lá
O que não existe mais é o caminho.
A folhagem pela manhã é bela
E fica perfumada
E perfuma o caminho que já não é mais caminho.

E fica perfumada pela imaculada fotossíntese.
O ar em tese, e a forma em síntese,
“Clorofila” esfera e esfinge.

E pássaros migratórios que nela pousam fartam-se
Da metamorfose de sua seiva
Embriagam-se do perfume que perfuma o caminho.

Há árvore ainda lá,
Porque não existe caminho,
Fechou-se com o tempo;
Fechou-se para o tempo
Já não vive nenhuma estação
Fechou-se solidão.

E até os pássaros procuram caminho.
Vale-nos o conselho:
O sol se nos nomeia guia
Caminho e protetor
E árvore;
Árvore do meio do caminho.

E o dia, de manhã, é presença de espírito
E árvore, e caminho do caminho.

A árvore copada
Às vezes florida
Às vezes escapelada;
Às vezes umbrosa e fresca
_ pura clorofila _
Outras vezes sombria.
Fria e horripilante é caminho.

A árvore continua lá
O que se se desfez é o caminho

E o sol determina o dia
E do que se perdeu do caminho...
Destino.

Ah! Essa árvore sobrevivente
Há essa árvore sobrevivente pelo caminho
De secas
De cercas
Aos cuidados de outrem,
A saber, como está e estará,
A estrada sem caminho
As curvas sem ninho
E pássaros sem pouso pelo caminho.
Como estará, ao entardecer, ilusório caminho?...

Se me recuso abraçar-me ao tronco
Acorrentar-me ao caminho
Crucificado a tal ponto
De tornar-me perfume e espinho.

E flores de primaveras perdem-se no caminho...
Expor-me sobre hastes
A sombras vazias?...

E gozar suas delícias
O fruto sem sabor
Às bordas do caminho?!...
Hoje é árvore à beira do caminho
Árvore e caminho.

Breve será tão somente toco ou espinho.

Será árvore, eterno caminho,
Se hoje sou lenhador
Foice e fogo
Vento ceifeiro
De flores e espinhos?

Estou doente;
Perdi minha auto-estima.
Estou mal-humorado com L
Já tenho, há muito, ultrapassado o mau com U
Próximo do dia D
No fim dessa opressiva distimia.

Hoje odeio risos
É-me, de mau gosto a alegria.
Não vejo sentido em nenhuma harmonia.
Nessa total desarmonia que é vida e viver
Nesse caminho sem ida
Nesse dia sem dia,
Nesse querer ser e ter sem poder...
Desprezo risos.
O meu
Alheio
Sem sol _ que amo tanto _,
Sem vida
Sem caminho.

Á mim, já esperança é, ser eu;
Sozinho.

Eu sem mim, por hoje, já basta;
Ao mundo basta
Toda alegria gasta
Toda serenidade farta
Toda gentileza
Toda farsa
Toda beleza sem forma
Toda luz que entorna do céu esparso
De nuvens negras que ao sol encobre...
E que ao meu olhar dilata
E só raios severos me ferem os olhos
E à alma traspassa.

E nenhum frescor nesse vão sem caminho
Eu tão só, comigo, sozinho...
Árvore, sol, e caminho.


Brincadeira!

Pego sobras,
Fios soltos,
De frases emaranhadas pelo poeta,
E as emaranho ainda mais
Tal qual uma tábua de pelos
Que apanha pássaros de apelos
Que revoam os céus pensar,
Tal canto vão de profeta;
Aí então me enlaço
E me enforco de pés e mãos
E cabeça
Pelo prazer de castigar meus pensamentos,
Que insistem em ser livres,
E eu os obedeça
Pássaros e céus
Antes que eu os esqueça.

Eu os detenho livres
Pois liberdade não existe
A céu aberto todo sol é triste
E toda nuvem esperança e consolo
Por isso os castigo
Judio-os para mantê-los ocupados e sadios
Sem manchas e dolos.

Quanto ao poeta...
É um vento vadio.

sábado, junho 23, 2007

Poemas - Conheça os mais belos poemas de Fernando Pessoa

Poemas de ricardo Reis (heteônimo de Fernando Pessoa)

A Abelha que voando

A abelha que, voando, freme sobre
A colorida flor, e pousa, quase
Sem diferença dela
À vista que não olha,
Não mudou desde Cecrops.
Só quem vive
Uma vida com ser que se conhece
Envelhece, distinto
Da espécie de que vive.
Ela é a mesma que outra que não ela.
Só nós — ó tempo, ó alma, ó vida, ó morte! —
Mortalmente compramos
Ter mais vida que a vida.


A Cada Qual

A cada qual, como a 'statura, é dada
A justiça: uns faz altos
O fado, outros felizes.
Nada é prêmio: sucede o que acontece.
Nada, Lídia, devemos
Ao fado, senão tê-lo.

Obs: _Todos os dias, aqui, um pouco deste fantástico Poeta. Volte sempre.

quarta-feira, junho 20, 2007

Reflexo

Nepente************************************************************Curare
De repente, veja só!... _ sou estranho a mim mesmo
E percebendo-me, todavia,mais original que nunca...
Um novo amor. ah!... um único amor, o último amor!
Ah! Pois sempre soube que o seria...Mágico, lindo...
Mesmo sem conhecê-lo _ exceto oculto em mim _
Desde sempre já o sentia _ eterno!
Agora, antes mesmo de tê-lo,
Diz-se no fim.
E eu o quero.
Moderno.
Lábios
Beijos
Boca
Seios
Risos
Sonhos
Paraíso
Em tudo há poesia!

Depende dos olhos de quem procura.
Seja na taça inebriante da alegria...
Seja no cálice torpente da loucura.


Lá fora sobe um sol triste
Tímido...

sexta-feira, junho 15, 2007

Janis Joplin - work Me Lord



Psiu!!!

...,


Dia após dia, palavras vêm à porta.
Teus ouvidos fecham-se a pronúncias.
Eu falo a reverso;
Meu coração a si próprio escuta.

Ele grita atordoado.
E aflito,
Sufoca-se no silêncio do próprio grito.

domingo, junho 03, 2007

Isso_ na sala de aula...

Quando te levantas e vais à frente
Risca o quadro negro em suave balanço
Meu olhar te segue
Meu coração dispara
E no teu X descanso

Da fórmula de Báskara me perco
Do teu corpo faço cerco
N’outra matéria me encontro.

Faço tudo por amor
E me perco por encanto;
Faço drama, faço graça, com humor;
Por ciúmes do teu balanço.

sexta-feira, junho 01, 2007

Sob blue moon



Do desespero que eu sinto, por amor, faço arte
Não arte clássica, com requinte, como Cervantes...
Pinto soluços, a agonia, tal qual, o soneto de Dante
Por loucura, por desejo, dor, por amar-te.

Em manhã fria, rósea a face, lábios escarlate
Vi-te; olhar de sol, fertilidade insinuante
Sobre um mar calmo, blue moon baixa e flutuante
Encantar-me os olhos, seduzindo-me a ti me dar-te.

De repente, do alto mar, tua voz me chama
Voz suave, sirena, de lua azul, que por amor reclama
E eu vou; vou sobre as águas, leve, delirante
Sexo em chamas.

Vou feito Cristo, Pedro, feito Dante
Vou Imaculado, aventureiro e incrédulo,
Perverso como antes.

quinta-feira, maio 31, 2007

Miss Universe 2007: Miss Japan Riyo Mori (in spanish)

A beleza brasileira em 2º lugar



Miss Universe 2007 (Top 5)



A beleza brasileira em destaque





Miss Universe 2007 Bikini Photoshot with Fadil Berisha



Miss Universe 2007 Swimsuit Photos


quarta-feira, maio 30, 2007

Enquanto ao sol nos aquecíamos

A flor, o riso, e o bom dia!...
E o beijo não beijado nos afligia...
O arrepio...
Frisson...

E o olhar golpeava um coração, gritava: “covarde! Não vês que eu te quero?”.
E um olhar golpeando o outro olhar... “Insensato! Não percebes que te amo?
Desprezas o amor por conta de conceitos.”

Falso moralismo! Desprezamos a vida.

Talvez em acordes, melhor expressaria os sentimentos;
Se meus olhos emudecem tácitos
Ao proferir palavras mudas,
E abraça em si, egoisticamente, o tudo de nós...
E cegam-se,
Ao ver explícito a imagem que se forma
Num tempo inexistente
Do amor nascido morto
Do perene corpo ressuscitado em vida
No universo que se forma dentro da gente.

Nossos olhos, se nos devoram-nos...
Bem sabemos o que somos:
_ Feras famintas _
Sentindo o gozo de sermos o que somos
No instante, devorados,
No silêncio escuro do receio ou ignorância...

Nos entregamos ao pensamento
Nessa estranha congruência
Do real e irreal da alma
Aflitos e constrangidos como velhas crianças.

Reféns aprisionados nas grades dessa fantasia
Formando para um espaço sem tempo
Conteúdo impalpável a perderem-se na lembrança
Como folhas soltas ao vento
Que se desfazem errantes
Porém,
No nada torturante da memória
Na ânsia de tornarem-se protagonistas de uma história,
Tornarem-se alusões ou sementes,
Para gerar sentido ou razão de ser vida
De ser algo em sentimento
E sermos verdadeiramente gente, pousamos...
Pousamos refutados

Pousamos sempre em lugar nenhum
Pousamos no espaço infértil
Pousamos em espaço aberto
Pousamos na liberdade de não ser
De não existir
E ser eterno por não pecar o pecado de viver.
Nossos olhos, se nos devoram-nos, bem sabemos o que somos:
Barulho e silêncio.

Talvez em acordes...
Talvez.

segunda-feira, maio 28, 2007

Sem pretensão

Longe de mim a idéia de separar o que é inseparável:
A amada ao amante, quando há amor, mesmo distante;
O maestro a música, quando há harmonia;
O artesão a arte, se há poesia.

Longe de mim, separar o inseparável,
Longe de mim tal crime, tamanha ousadia.
O que une a essência à outra essência é indispensável à vida.
Mesmo que tal essência pareça disforme e cause estranheza
Como flores frágeis em espinheiro
No fim nota-se de cada num todo o valor
Independente de ser estranho aos olhos
De toda natureza forma-se o universo
E todo o corpo-universo forma-se natureza.

Assim o amor: um instante de conflito para uma eternidade de incomparável harmonia e beleza. Melhor deixar, o tempo é jardineiro.

domingo, maio 27, 2007

Hoje

Cesta, flores, sol, e domingo


Em meu peito abrem-se de novo antigas chagas
Quando as noites se fazem mais frias
E as manhãs nebulosas expiram
O bafo aromático dos feitos noturnos

Faces carregadas de cansaço e alívio
De noites mal-dormidas
Por amor ou dor, solidão...

Todos tomam café da manhã
Até ao meio dia
Até onde rasgará esta ferida?

Tudo se enleia num rasgo sem nexo
Para a unificação de uma única cicatriz...

Nossas dores suportadas em silêncio
São cicatrizes de feridas aparentes
Ferida que nunca se fecha fecha-nos;

Dividimos o indivisível
Para tudo tornar invisível
Toma-se cafeína
Cada qual toma seu café
Amargo?
Cospe-se por ai as amarguras.

Prazer nem para o sexo
Faz-se por fazer
Por vício ou obrigação
Consciente da inconsciência
Do contágio da putrefação.

Ai! Ais que se curam...
Curvo-me diante da insensatez
Como seria a vida feita só de razão
Razão por razão é aritmética;
Sou mais os insetos minúsculos
Que tecem e produzem
Que fazem mel e veneno
E da voz aos olhos
E tornam a insanidade dos sábios
Na loucura da sabedoria de suave expressão.

Bebamos café!
Hoje se alia à minha solidão que se estende da noite
Fantasmas projetando-se já dantes manifestos
No futuro de hoje e de dias distantes
Como se não bastasse a palavra em si
E essa representatividade enigmática e imprevisível
O vento que sob o sol se agita
O dia _ prenúncio de destruição_ veículo para eterna noite,
Há manchetes assustadoras em todos os jornais e revistas
E evitamos a luz para não sangrar as vistas
Reuniões de emergência para camuflar negligências
Nenhum projeto em pauta
Para se estabelecer paz, nenhum plano...

Seguimos estrelas para a escuridão.

Quantas flores, neste domingo, celebrariam a perfeita união dos amantes
Unen-se, entanto, em coroa e perfume
Para adorno de jazigos de corpos precocemente abatidos
Por nossas mãos_ membros dessa gangue sociedade errante e insensível?

Cada dia é uma página por nós ilustrada
Com imagens de chacinas e miséria, e corrupção.

E a justiça é cega, e cega, e nada se vê.
E os direitos humanos faz-se em prol dos desumanos.
E a religião_ paiol da fé_ constrói templos luxuosos e edifícios
Para a propagação de sacrifícios
Com o suor dos ingênuos fiéis
E o pão?
Qual pão alimentar-nos-á
Se comíamos esperança e esperança já não temos
Se nos alimentávamos de domingo
E o domingo fez-se insípido, triste...
A fé já não é mais fé, é fetiche,

E do verbo vida não se conjuga nenhum tempo
Nada mais é o que existe
Tudo é feito ou efeito.

Abro os olhos e vejo cegueira
De morte
De corpo sem alma
E almas em delírio

Num transe vago um lampejo
E um beijo de morte
Logo o tédio na brisa do repentino desejo

E os olhares dos olhos se repelem
Aflitos a olhares alheios
Não pousam; perdem-se;
No fundo escuro de taças borras
De flores de cachimbo
De domingo de barro
De pó de nozes
De nós
De manhã.

Quanto a mim nada faço
Não tenho mãos para arregaço
Nem título nem índice
Nenhum verso para a história
Nenhum choque n’alguma memória
Nem poesia;
Só suspiro, sou cúmplice,
_parte íntegra dessa hipocrisia... CIDADANIA.

sexta-feira, maio 25, 2007

Soneto de separação


Soneto de separação (Vinicius de Moraes)

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se triste o que fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Veja também:
Antítese- http://poetray.blogspot.com/

http://novapoesia.zip.net
Requinte e qualidade- os melhores vídeos
http://look-videos.blogspot.com/
Nova poética
http://ray.ray.zip.net/

terça-feira, maio 01, 2007

A tristeza de ontem

Ela bate em minha porta
Ela bate com insistência
Ela sempre vem
Bata bate, e se posta;
Ela testa minha paciência
Eu finjo não ter ninguém.

Ela já esteve mais feia
Com uma cara esquelética e carrancuda
Tentou se afogar em prantos
Quase me leva a loucura.
Já me fez sérias ameaças
Já tentou invadir-me por outras portas
Já me apedrejou o telhado
Quis até me levar à sepultura.

Ela sentou-se à minha porta.
Eu a olho de soslaio
Eu a olho disfarçado, pela fresta,
Eu a olho por entre abril e junho
No 15... 22...
Nas belas manhãs de maio.

Hoje ela está bonita!
‘Ta vestida de festa
Camuflada de alegria
Fantasiou-se de “Margarita”.
Tem amarrado ao cabelo
Uma flor e um laço de fita...
Ela se vestiu de longo,
_ vermelho, verde e rosa _
Ela quer que eu reflita.

Ela ‘ta de chocalho no tornozelo
Tão tímido quanto as castanholas...
Deve ter nas mãos algum novelo
Onde o destino enrola e desenrola...

Eu a ignoro,
Mas me perturba as batidas e os silêncios dos seus gritos,
Por isso paro, fecho o livro,
Volto ao índice,
Escolho o título e reflito.
Leio o poema,
Ouço as vozes,
Outro silêncio,
Outro grito.

Mas hoje eu reflito de cabeça erguida.
Fixo meu olhar no infinito.
É no céu que brilham as estrelas
Estrelas é que se torna mito.

Eu vou abrir a porta,
Vou deixar que ela entre.
Vou imprimi-la numa página
E ver como ela se sente.
Afinal ela é minha
_ só minha _
É feia e triste,
Mas é fiel à minha mente.

É dor, é mágoa, é saudade...
É esperança, é tudo;
Além de tudo é amor...
Tem candura e sinceridade!

Então, que ela entre;
Entre com tudo que tem
Despeçamo-nos, juntos, do ano,
E abracemos o ano que vem.

Ela é a tristeza de ontem
É a tristeza de hoje também
Mas é a única tristeza amiga
Uma tristeza que só me faz bem.

Entre luzes de natal
E expectativas de reveillon
Vivamos euforia de carnaval
Sob o luto desta paixão;
Saudemo-nos com lembranças
Como brinde de ano-bom.
Ascenda-se coração!
Bebamos sol
Ceemos manhãs
Aguardemos ressurreição.

Afinal,
Eu sou o templo do tempo
Sem mim tempo algum não é ninguém!


sexta-feira, abril 27, 2007

David Elsewhere VW Golf GTi "Singing in the Rain" style Commercial in Europe

David Elsewhere, the human robot dancer doing his thing for Volkswagen's Golf Gti commercial i believe this was aired in Europe (look at the license plate).

domingo, março 04, 2007

Você precisa conhecer





A casa onde nasci e fui criado ainda está de pé.
Na verdade eu nasci para a vida num casebre, na roça;
Mas acho que se nasce para o mundo quando se forma lembranças,
Onde se faz acontecer algo para ser lembrado. Isso.

Minha mãe me deixava à sombra do cafezal e cantava
Enquanto colhia café. Os galhos de grãos maduros eram raspados diretamente num balaio, os grãos secos geralmente caiam sozinhos, era o meu trabalho catá-los. Depois espalhávamos tudo, no terreiro, ao sol. Era divertido pisá-los!

O doce travo de café maduro de vez em quando me leva àqueles dias e colheita. É um gosto estranho até de ser lembrado; mas eu gosto. Aí eu fico recordando detalhes, coisas sem nenhuma importância, sem influência para os meus dias atuais, coisas fúteis que vem e vão como uma brisa de nostalgia.

Eu gostava de ver os sabiás; suas corridinhas rápidas e curtas, e o vôo rasteiro.Há uma época no ano em que eles não cantam. É como se ocultassem o canto, em ensaios sigilosos, para se apresentarem impecáveis no começo das águas. E é nesse período de impecabilidade na expressão da alegria que eles se acasalam, e ao nascer os filhotes aperfeiçoa-se o concerto. É também de um entendimento irreprochável de voz entre as insaciáveis criaturinhas e os famintos tenores. Para cada afastamento um comportado silêncio, a cada viagem uma minhoca, e aquela euforia, a cada pouso uma ária para maior encanto da ópera.

Acho que é certo dizer que os bichos se amam e os homens trepam quando se aliam para o prazer, ou procriar. É notável que os bichos se guiem tão bem! Eles acasalam com o sexo oposto, sempre; o homem às vezes erra. Ignoremos!

O tiziu, negrinho simpático, eu adorava vê-lo cantar; ele dá um grito e pula e cai no mesmo lugar no galho.

Eu gostava de observar o comportamento das aranhas naquele emaranhado trigonométrico e complexo das teias. As moscas eram presas fáceis para a degustação lenta.
Eu temia os enormes marimbondos e o esquisito besouro negro: o rinoceronte.
A galinha d’angola às vezes pisava seus próprios pintinhos xadrezinhos, tantos eram que a acompanhava. E os teiús sempre atacavam; Chupavam os ovos, comiam os pintos e chicoteavam o galo e as galinhas. Pelo barulho minha mãe já sabia: “o teiú ta no quintal!”.

Minha mãe cantando, ajeitando o lenço na cabeça, cobrindo os cabelos brancos... Eu já a conheci assim: cabelos grisalhos, orvalhados, como gotas de sereno no gramado nas manhãs de inverno.

Todos os dias nós tínhamos visitas. Todas lhe pediam a bênção. Quase todos eram seus afilhados. De quase todos ela fizera o parto. A todos considerava seus filhos.

Ela parava o trabalho e ia fazer café novo. Como é bom o cheiro de café sendo coado! No cesto nunca faltava quitanda: biscoito de polvilho, bolo de fubá, rosquinhas...Huuumm! Esse cheiro de cozinha mineira!
Os ares interioranos é um alento mágico na minha memória.

Ela era franzininha, frágil, sofria de asma e cheirava a poejo e hortelã, mas não se entregava à fraqueza, não sossegava um minuto. Com ervas que ela mesma cultivava ou colhia no mato, ela preparava remédio para as pessoas, principalmente para os bebes e as mães após o parto. Quando ela saia para fazer parto eu ficava triste, sentia uma angústia que ainda hoje não consigo dar nome. E quando caia uma tempestade eu tinha medo dos rios cheios, das pinguelas velhas, da sua asma... Eu tinha medo que ela morresse, eu tinha medo do mundo, da vida sem ela; eu tinha medo da solidão. Mas eu não falava pra ninguém, eu sempre tive medo de falar da morte. Achava que só era decente falar de coisas que alegrasse o coração.

A cama parecia ter espinhos. Eu sentia frio, tinha pesadelos e fazia xixi na cama. A noite parecia interminável. Surgiam estranhas imagens na parede que faziam negaças mexendo comigo. Mas entre os fantasmas havia um que eu não temia, acho que porque ele apenas me olhava e sem sorrir me sorria; até que o quarto tomava um tom azulado, e na parede uma luz lilás acendia, vinha um perfume, de poejo e hortelã, ou rosa branca e alecrim, vinha como um vento numa sombra transparente e me cobria.

Quando ela retornava, do modo com que me olhava, eu sabia que ela dizia: “Eu sei, eu estava aqui, o tempo todo, eles vinham e eu te escondia”.
Não sei porque nunca falamos sobre isso. Era tão íntimo que só nosso silêncio sabia. Também nunca dissemos: _Eu te amo_ em voz alta.

Agora eu digo a ela todos os dias: “Mãe, eu te amo!” E ela não pode me responder, talvez não possa me ouvir; mas sinto que se emociona comigo, em mim, pois ainda sinto seu perfume, o cheiro de remédio, de flores, de quintal, de café, de jardim... E ainda hoje, quarenta e tantos anos, só com a cabeça nos seus seios é que consigo dormir.
Acho que isso é que é ser eterno: Ser verdade, invisível, mas transcendente em quem amamos, e vivermos eternos como éramos, onde estávamos, parte da natureza e do tempo.

Ah! Ela ia adorar você, tenho certeza disso.

Você precisa ver; melhor que o cheiro de café, e mais belo e excêntrico que a cor e o doce travo do grão, são as flores alvas, como manto do cafezal, e o canto misterioso de um pássaro que revoa um certo coração... Repleto de amor.
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Simples assim

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